Prevalência de Candida spp. em amostras cervico-vaginais e a suscetibilidade in vitro de isolados | Minions

Discussão

O presente estudo fornece dados sobre o isolamento de Candida spp. da mucosa vulvovaginal de mulheres no sul do Rio Grande do Sul, Brasil. Detectamos a levedura em 27% da população do estudo, correspondendo a uma prevalência de aproximadamente 13% tanto para colonização quanto para candidíase vulvovaginal. Taxas semelhantes e menores de isolamento fúngico em mulheres com e sem vulvovaginite têm sido descritas em outros estudos da região sul: 11 e 24,7% em pacientes no estado do Paraná12, 13, 14, 15, 23,8% em pacientes no estado de Santa Catarina12 e 18,2% na cidade de Santo Ângelo-RS16, sendo este último o único estudo realizado no Rio Grande do Sul. Estas diferenças no isolamento de Candida spp. da mucosa vaginal podem ser explicadas pelos hábitos culturais de diferentes regiões, especialmente no que diz respeito às práticas de higiene, pois este fator está diretamente relacionado à autocontaminação, pois a levedura pertence à microbiota normal do trato gastrointestinal.3, 17, 18 Por outro lado, estudos similares no nordeste brasileiro mostram isolamento fúngico em mulheres com e sem vulvovaginite de até 46%.1, 17, 19, 20 Supõe-se que outros fatores além dos mencionados acima possam explicar a alta prevalência de Candida spp. nesta região, como condições climáticas e fatores sociais e ambientais favoráveis à reprodução de leveduras.20

A taxa de colonização de 13,7% observada em nosso estudo é consistente com a literatura3,9 que descreve que Candida spp. faz parte da microbiota genital de até 30% das mulheres saudáveis.1, 18 Enquanto a doença ocorre de forma endógena, é importante diferenciar entre colonização e infecção da mucosa vaginal.3, 18

Ferrazza e colaboradores12 encontraram uma prevalência de VVC de 19,2% em Santa Catarina e de 9,3% no Paraná; estes dados são semelhantes à prevalência de VVC encontrada em nosso estudo.12 Entretanto, está abaixo dos 69% encontrados pela Holanda e colaboradores17 em um estudo realizado em Natal, dos 47,9% encontrados por Andrioli e colaboradores1 na Bahia, dos 42,7% descritos por Sá e colaboradores20 no Maranhão e dos 39,6% encontrados por Dias e colaboradores7 no Mato Grosso. Considerando que esta doença é oportunista, esta discrepância pode estar relacionada a diversos fatores relacionados ao agente etiológico, à distribuição da espécie e/ou virulência das cepas, ao status imunológico do hospedeiro ou ao meio ambiente, o que influencia a manutenção da temperatura e umidade propícia à proliferação fúngica.1, 12, 20, 21

As diferenças de localização geográfica devem ser consideradas entre os fatores epidemiológicos que também interferem na prevalência de Candida spp. isolada da mucosa vaginal.12 Neste estudo, C. albicans foi predominante, representando mais de 60% dos isolados tanto em pacientes colonizados quanto naqueles com VVC. Na verdade, esta espécie é a mais patogênica do gênero, estando relacionada à maioria dos casos de CVV descritos, e geralmente representa mais da metade dos isolados identificados em outros estudos.7, 15, 16, 22 Ferraza e colaboradores12 descreveram a identificação desta espécie em Santa Catarina em 100% e 72% dos isolados dos pacientes assintomáticos e sintomáticos, respectivamente, e em 66,7% dos pacientes com CVV no estado do Paraná. Da mesma forma, Camargo e colaboradores16 identificaram C. albicans em mais de 80% dos isolados de pacientes com e sem VVC em Santo Ângelo-RS.

Aproximadamente 25% dos casos de VVC foram causados por espécies não-albólicas em nosso estudo. Entre estes, C. glabrata, descrita como a segunda espécie mais importante nos casos de VVC devido à sua freqüência10, 12, 15, 18, 23 e maior resistência aos antifúngicos10, 22, 24 foi encontrada em 8,6% dos pacientes sintomáticos e em 14,3% dos pacientes colonizados em nosso estudo, o que destaca a importância dos testes laboratoriais para correta identificação do agente etiológico, embora o diagnóstico clínico da doença seja facilmente realizado e comumente aplicado.2, 25

Considerando as variáveis estudadas, o maior número de pacientes com CVV foi do grupo de mulheres menores de 31 anos, estando dentro da faixa etária reprodutiva,3 o que é considerado um fator de risco para CVV devido à atividade sexual.8 Entretanto, esta diferença de idade entre o grupo de mulheres com CVV e o grupo sadio não foi detectada por outros autores.1, 17, 19, 23 Da mesma forma, o uso de contracepção hormonal ou dispositivos intrauterinos, pH vaginal ≤ 4,5, gravidez e infecção pelo HIV, que são considerados fatores de risco para o desenvolvimento de VVC3, 5, 20, 26 não foram significativamente associados à infecção por VVC em nosso estudo. Essa discrepância pode ser devida ao pequeno número de mulheres com VVC em nosso estudo (n = 35), o que não permite uma análise estatística robusta dos fatores de risco para a doença.

De acordo com nosso estudo, assim como o de Rodrigues e colegas de trabalho23 , as outras variáveis, como estado civil, nível educacional e cor da pele não exercem influência significativa no desenvolvimento da VVC. Além disso, Álvares e colaboradores4 afirmam que a microbiota vaginal das mulheres negras tem menor incidência de espécies bacterianas e, portanto, haveria uma diminuição das defesas naturais contra o crescimento fúngico, predispondo-as à infecção por Candida spp.4, 20

Estudos in vitro mostraram diferentes taxas de resistência de Candida spp. desde a mucosa vaginal até os fármacos azólicos comumente usados no tratamento e profilaxia de VVC.7, 8, 10, 11, 13, 22, 24, 27, 28 Em relação ao fluconazol, as taxas de resistência variam de 0,8% a 12,5%.7, 10, 11, 24, 28 Estes valores são consideravelmente inferiores aos resultados encontrados em nosso estudo, no qual 42% dos isolados foram resistentes ao fluconazol. No entanto, Dalazen e colaboradores22, em estudo realizado em Santa Catarina, encontraram 100% de resistência ao fluconazol. Com relação ao itraconazol, as taxas de resistência descritas em outros estudos variam de 1,9 a 43%,10, 13, 27, 28 também inferiores aos 48% encontrados em nosso estudo. Além da alta taxa de resistência ao fluconazol e ao itraconazol observada, o FMC de mais de 90% dos isolados foi superior à concentração máxima de antifúngicos testada. Portanto, há uma tendência em evitar o uso profilático de baixas doses de antifúngicos em rotinas ginecológicas para evitar o aparecimento de isolados resistentes a drogas.2

Outro grupo de fármacos azólicos utilizados para tratamento tópico do VVC é o miconazol.22 Em nosso estudo, o MIC para este medicamento variou de 0,031 a 8 μg/mL. Estes dados foram semelhantes aos encontrados em um estudo de Choukri e colaboradores29 no qual o MIC para o miconazol variou entre 0,015 e 8 μg/mL e em um estudo de Richter e colaboradores10 no qual a variação foi entre 0,007 e 4 μg/mL. Além disso, Dalazen e colaboradores22 encontraram uma variação no MIC do miconazol entre 0,097 e ≥100 μg/mL. Os diferentes genótipos da mesma espécie podem ser significativamente diferentes em sua suscetibilidade aos azóis.27

Os agentes poligenéticos são outro grupo de drogas utilizadas para o tratamento da VVC; este grupo inclui a nistatina, que é a mais utilizada no Brasil e está disponível gratuitamente no Sistema Único de Saúde (SUS) no Brasil.30 O MIC de nistatina encontrado em nosso estudo variou de 2 a >16 μg/mL; entretanto, em um estudo de Choukri e colaboradores,29 o MIC variou entre 1 e 4 μg/mL, e em um estudo de Richter e colaboradores,10 a concentração variou de 1 a 16 μg/mL. O conhecimento dos padrões de susceptibilidade a drogas típicas em isolados de diferentes regiões permitirá a racionalização do uso empírico de agentes antifúngicos, contribuindo assim para o controle da resistência isolada a drogas.2

Nossos resultados estimularão o desenvolvimento de outros estudos relacionados aos mecanismos de resistência dessas leveduras e também de ensaios clínicos no hospital para determinar se a alta resistência aos antifúngicos detectados in vitro corresponde realmente a uma falha terapêutica.

De acordo com essas discrepâncias de dados e a falta de dados epidemiológicos no Estado do Rio Grande do Sul, o presente estudo vem colaborando com a epidemiologia local, elucidando os fatores etiológicos da VVC e alertando para as altas taxas de resistência encontradas in vitro nos isolados de Candida spp. avaliados.

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